Complemento da Ação: PARECER JURÍDICO
I- RELATÓRIO
A Presidência da Câmara de Vereadores solicita-nos parecer acerca do Projeto de Lei que dispõe sobre a instituição da “OBRIGATORIEDADE DE ATENDIMENTO PREFERENCIAL ÀS PESSOAS COM FIBROMIALGIA E A INCLUSÃO DO SÍMBOLO MUNDIAL DA FIBROMIALGIA NAS PLACAS OU AVISOS DE ATENDIMENTO PREFERENCIAL NO MUNICÍPIO DE IBATIBA/ES.”
É o relatório. Passo a opinar.
II – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
O referido Projeto de Lei dispõe sobre a instituição no âmbito do Município de Ibatiba, sobre a obrigatoriedade de atendimento preferencial às pessoas com fibromialgia e a inclusão do símbolo mundial da fibromialgia nas placas ou avisos de atendimento preferencial no município de Ibatiba/ES.
Da leitura do texto é possível concluir pela inconstitucionalidade formal da norma. Neste sentido, passemos a análise dos fundamentos jurídicos, que nos levaram a concluir por referido entendimento.
Inicialmente e considerando que a pessoa com fibromialgia é pessoa portadora de deficiência para todos os efeitos legais, há de se observar que a Lei nº 10.048/2000, que versa acerca da prioridade de atendimento, congloba as pessoas com deficiência, idosos com idade igual ou superior a 60 anos, gestantes, lactantes, pessoas com criança de colo e obesos.
Dessa forma, resta garantido que as pessoas com fibromialgia já possuem prioridade de atendimento em todas as instituições e estabelecimentos de atendimento ao público.
Assim, é válido lembrar que a legislação municipal não pode contrariar a legislação federal e estadual e, tampouco, ser repetitiva.
Neste sentido, inclusive, colacionamos abaixo a recente lei estadual nº 12.087/24 que já determina especificamente tal prioridade, senão vejamos:
LEI Nº 12.087, DE 16 DE ABRIL DE 2024
Dispõe sobre o atendimento prioritário à pessoa com fibromialgia nos estabelecimentos públicos e privados no Estado do Espírito Santo.
O GOVERNADOR DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
Faço saber que a Assembleia Legislativa decretou e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Os estabelecimentos públicos e privados, no Estado do Espírito Santo, ficam obrigados a garantir o atendimento prioritário à pessoa com fibromialgia durante todo o horário de expediente.
Art. 2º VETADO.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação oficial.
Palácio Anchieta, em Vitória, 16 de abril de 2024.
JOSÉ RENATO CASAGRANDE
Governador do Estado
Este texto não substitui o publicado no D.O. de 17/04/2024.
Sendo assim, é inviável a edição de uma lei municipal que visa abordar as matérias já disciplinadas. Dessa forma, destaca-se que a atividade legislativa deve atender ao princípio da necessidade uma vez que, conforme leciona o Ministro Gilmar Mendes:
“Embora a competência para editar normas, no tocante à matéria, quase não conheça limites (universalidade da atividade legislativa), a atividade legislativa é, e deve continuar sendo, uma atividade subsidiária. Significa dizer que o exercício da atividade legislativa está submetido ao princípio da necessidade, isto é, que a promulgação de leis supérfluas ou iterativas configura abuso do poder de legislar.” (MENDES, Gilmar Ferreira. Teoria da Legislação e Controle de Constitucionalidade. Algumas Notas. Revista Jurídica Virtual da Presidência da República. Disponível em: https://revistajuridica.presidencia.gov.br/ojs_saj/index.php/s aj/article/view/33/26)
Não obstante, o art. 1º e 4º invadem a competência do Poder Executivo, quando criam obrigações aos órgãos da administração pública. Ressaltamos que, por força do princípio da separação dos poderes, insculpido no art. 2º da Constituição Federal, não cabe ao Poder Legislativo criar normas que autorizem e/ou obrigam o Executivo a realizar tarefa afeta a sua competência, sob pena de flagrante inconstitucionalidade.
Por outro lado, sendo a iniciativa privada obrigada a realizar as tarefas citadas (conforme art. 3 e 4º do PL), deve-se examinar se o ato de criar tais obrigações não ferirá os princípios constitucionais da livre iniciativa e da ordem econômica, esculpidos nos artigos 1º, IV; 170 e 174 da Constituição da República e, consequentemente o da razoabilidade.
A proposta também determina prazo para que o Poder Executivo exerça sua atribuição de regulamentar a norma (Art. 5º do PL). Nesse sentido, tem decidido de maneira peremptória o Egrégio Supremo Tribunal Federal. Confira-se o teor da ADI no 3.394, de Relatoria do Ex-Ministro Eros Grau: Observe-se, ainda, que, algumas vezes, rebarbativamente (art. 84, IV), determinadas leis conferem ao Executivo autorização para a expedição de regulamento tendo em vista sua fiel execução; essa autorização apenas não será rebarbativa se, mais do que autorização, impuser ao Executivo o dever de regulamentar'. No caso, no entanto, o preceito legal marca prazo para que o Executivo exerça função regulamentar de sua atribuição, o que ocorre amiúde, mas não deixa de afrontar o princípio da interdependência e harmonia entre os poderes.
A determinação de prazo para que o chefe do Executivo exerça função que lhe incumbe originariamente, sem que expressiva de dever de regulamentar, tenho-a por inconstitucional. Nesse sentido, veja-se a ADI 2.393, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ de 28-3- 2003, e a ADI 546, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 14-4- 2000.
Neste sentido, conclui-se pela inviabilidade jurídica do Projeto de Lei apresentado, na forma das razões exaradas acima, motivo pelo qual não reúne condições para validamente prosperar.
Diante do exposto, concluímos no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade formal do projeto de lei ora sob análise.
É o parecer.
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