Complemento da Ação: PARECER JURÍDICO
I- RELATÓRIO
Foi encaminhado a Procuradoria Jurídica para emissão de parecer, o Projeto de Resolução, que dispõe sobre concessão do benefício do auxilio alimentação aos Vereadores da Câmara Municipal de Ibatiba e da outras providências.
É o relatório. Passo a opinar.
II – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
O projeto versa sobre matéria de competência do Município em face do interesse local, encontrando amparo no artigo 30, I da Constituição Federal e no artigo 31, IV da Lei Orgânica Municipal.
O art. 31, III e IV da Lei Orgânica Municipal dispõe que a iniciativa para proposituras de projetos desta natureza é privativa da Câmara Municipal. Senão Vejamos:
Art. 31. Compete privativamente à Câmara Municipal:
III - dispor sobre sua organização, funcionamento e segurança
IV - dispor sobre a criação, transformação ou extinção de cargos, empregos ou funções de seus servidores e a fixação das respectivas remunerações, observados os limites do orçamento anual e dos seus valores máximos, conforme estabelece o art. 37, inciso XI, da Constituição Federal;
Podemos notar que o dispositivo citado acima, possui simetria com o art. 51, IV e 52, XIII da Constituição Federal, que assim dispõem, in verbis:
SEÇÃO III
DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:
IV - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
SEÇÃO IV
DO SENADO FEDERAL
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Como visto, tanto em âmbito federal (Senado Federal e Câmara dos Deputados), quanto no âmbito municipal, competem as Casas Legislativas a iniciativa de leis que versem sobre sua organização, funcionamento, entre outros. Este é, inclusive o entendimento do Supremo Tribunal Federal, senão vejamos:
“As normas que são objeto da presente ação direta alteram remuneração dos servidores das duas Casas Legislativas, majorando-a em 15%. Não há dúvida, portanto, de que não se trata de norma que pretendeu revisão geral anual de remuneração dos servidores públicos, mas de norma específica, das respectivas Casas Legislativas, concedendo majoração de remuneração a seus servidores. A CF, em seu art. 37, X, na redação que lhe foi dada pela EC 19/1998, estabeleceu expressamente que a remuneração dos servidores públicos somente poderá ser fixada ou alterada por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso. (...) Assim, não há ofensa ao referido dispositivo, nem mácula ao art. 61, § 1º, II, a, da Constituição pelo fato de as normas impugnadas serem de iniciativa das respectivas Casas Legislativas. É a própria Constituição, também após as alterações supramencionadas, advindas da EC 19/1998, que lhes dá tal prerrogativa: "Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados: (...) IV – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias"; "Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (...) XIII – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias". Por fim, também não há que se falar em ofensa ao princípio da separação de poderes; pois, conforme demonstrado, é a própria Constituição que estabelece as competências nesse âmbito.
[ADI 3.599, voto do rel. min. Gilmar Mendes, j. 21-5-2007, P, DJ de 14-9-2007.]
No mesmo sentido, registro o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, vejamos:
“Ação Direta de Inconstitucionalidade – Lei Municipal – Lei nº 841/2008, do Município de Bertioga, que “Define a estrutura administrativa e o quadro funcional da Câmara Municipal de Bertioga” - Matéria de exclusiva competência do Poder Legislativo[...] – O modelo do processo legislativo federal deve ser seguido aos Estados e nos Municípios, à luz do princípio da simetria – Violação do princípio da separação de poderes – Ofensa aos arts. 5º, 19, 20, 111 e 144 da Constituição Estadual – Ação julgada procedente. “ - ADI nº 176.483-0/3-00, j. em 16/09/2009.
Alexandre Moraes (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, 6º ed., Atlas - 2006, p. 1067), ponderando acerca da competência da Câmara dos Deputados para criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções de seus servidores, aduz que:
“A EC nº 19, de 4-6-1998 (Reforma Administrativa), alterou significativamente a redação do inciso IV, do art. 51, mantendo a competência da Câmara dos Deputados para criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções de seus servidores, porém, transformando a antiga competência para fixação da respetiva remuneração em iniciativa privativa do projeto de lei, que deverá ser aprovado pelo Congresso nacional e sancionado pelo presidente da República. Antes da Reforma Administrativa, a fixação de remuneração constituía ato privativo da própria Casa Legislativa, por meio de resolução.” – grifos nossos e no original.
Especificamente sobre a concessão de auxilio alimentação aos vereadores, observo que recentemente houve a elaboração de Parecer Consulta do Tribunal de Contas do Estado do Espirito Santo, autorizando a instituição de referido benefício, senão vejamos:
Parecer em Consulta 00007/2024-1 - Plenário Processo: 07429/2023-8 Classificação: Consulta UG: TCEES - Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo Relator: Davi Diniz de Carvalho
CONSULTA – NECESSIDADE DE REVISÃO DE PARECER EM CONSULTA - ALTERAR CONTEÚDO DO PARECER 5/2021 E 25/2005 - MANTER O CONTEÚDO DO PARECER EM CONSULTA 14/2005 - ACOMPANHAR ENTENDIMENTO CONSTANTE NA INSTRUÇÃO TÉCNICA DE CONSULTA 1/2024 - NOTIFICAR - ARQUIVAR. 1. Por iniciativa fundamentada do Presidente, de Conselheiro, do Ministério Público junto ao Tribunal ou a requerimento de legitimado, o Tribunal poderá reexaminar matéria objeto de consulta; 2. Afastar a condicionante de comprovação detalhada da jornada de trabalho e das atividades parlamentares exercidas para fins de recebimento de auxílio alimentação por vereadores.
No mesmo sentido e confirmando o entendimento acima, o Voto do Relator 00171/2025-1 Produzido em fase anterior ao julgamento Processo: 08965/2024-8 Classificação: Consulta Setor: GAC - Rodrigo Coelho - Gabinete do Conselheiro Rodrigo Coelho Criação: 16/01/2025 13:59 UG: CMBE - Câmara Municipal de Boa Esperança Relator: Rodrigo Coelho do Carmo Consulente: CARLOS VENANCIO:
“Os autos foram, em impulso inicial, ao Núcleo de Jurisprudência e Súmula – NJS, que por meio do Estudo Técnico de Jurisprudência 25/2024 (evento 07) informou acerca da existência de deliberações deste TCEES relacionadas com os questionamentos suscitados pelo consulente, nos seguintes termos:
(...) 3. CONCLUSÃO Ante o exposto, nos termos do art. 445, inciso III, do RITCEES, após consulta ao sistema de jurisprudência desta Corte de Contas, conclui-se informando a existência das seguintes deliberações sobre o objeto da consulta.
3.1 Quanto à legalidade, limites e requisitos da concessão de auxílio alimentação Legalidade da concessão de auxílio-alimentação aos vereadores (Itens 1 e 2): 1. Pareceres em Consulta TC 07/2024, 05/2021 e 25/2005 e Acórdão 878/2023: permitem o pagamento de auxílio-alimentação a vereadores, estabelecendo como condição ou requisito o efetivo exercício da atividade legislativa ou de fiscalização pelos vereadores, seja na sede da Câmara ou fora dela, porém dispensando a comprovação detalhada da jornada de trabalho, o que responde aos questionamentos dos itens 01 e 02. 2. Acórdão 878/2023: registrou a possibilidade de se descontar o valor do auxílio-alimentação de forma proporcional à quantidade de faltas dos vereadores às sessões legislativas, em analogia ao art. 55, III, da CRFB/88, o que poder complementar a resposta ao questionamento do item 02. 3. Parecer em Consulta TC 14/2005: dispensa a observância ao princípio da anterioridade para a instituição de verbas de caráter indenizatório em prol de vereadores, dentre as quais inclui-se o auxílioalimentação, o que poder complementar a resposta ao questionamento do item 02. 4. Pareceres em Consulta TC 05/2020 e 11/2012: entendem, respetivamente, que o auxílio-alimentação, por possuir natureza indenizatória, não deve ser submetido ao teto remuneratório constitucional, bem como não deve ser computado no limite de gastos com pessoal do correspondente Ente ou Poder Público, o que também poder complementar a resposta ao questionamento do item 02.
3.2 Quanto a existência de precedentes e orientações sobre outros benefícios indiretos similares (Item 3): 1. Parecer em Consulta TC 14/2005: se manifesta favoravelmente à possibilidade de pagamento de diárias a vereadores, o que responde, de forma parcial, não exaustiva, o questionamento do item 03. 2. Pareceres em Consulta TC 19/2015, que revisou o Parecer em Consulta TC 03/2008: entenderam pela possibilidade de concessão de telefonia móvel para uso funcional por vereadores, que compuserem a Mesa Diretora de Câmara Municipal, através de ato normativo infralegal do próprio Poder Legislativo, o que responde, de forma parcial, não exaustiva, o questionamento do item 03. 3. Pareceres em Consulta TC 31/2005 e 38/2003: se posicionaram favoravelmente à possibilidade de a Câmara Municipal conceder combustível a vereadores que utilizarem o próprio veículo em prol do interesse público, sob algumas condições, o que responde, de forma parcial, não exaustiva, o questionamento do item 03.
3.3 Quanto à possibilidade de prever o benefício na mesma norma que contempla servidores públicos (Item 4): 1. Pareceres em Consulta TC 05/2021 e 25/2005: estabeleceram a possibilidade de o auxílio-alimentação dos vereadores ser instituído por meio de Resolução da respectiva Câmara Municipal, porém não mencionam se o ato normativo, instituidor do auxílio-alimentação, deveria ser específico para os vereadores ou se poderia ser o mesmo destinado aos demais servidores públicos do Poder Legislativo, o que responde, de forma parcial, o questionamento do item 04. 3.4 Quanto à aplicação dos mesmos critérios estabelecidos para servidores públicos (Item 5): 1. Pareceres em Consulta TC 07/2024, 05/2021 e 25/2005 e o Acórdão 878/2023: consideram as peculiaridades do cargo de vereador em comparação aos cargos dos demais servidores públicos, em especial quanto à sua jornada de trabalho, a qual não é fixa e sequer exige dedicação exclusiva, para condicionar o pagamento de auxílio-alimentação a vereadores somente aos “dias em que estejam no exercício de suas tarefas constitucionais, quais sejam, atividades legislativas e de fiscalização”, o que responde, de forma parcial, o questionamento do item 05. (...)
III – CONCLUSÃO
Diante do exposto, a Procuradoria Jurídica opina pela POSSIBILIDADE JURÍDICA da tramitação, discussão e votação do projeto de resolução ora examinado. A emissão de parecer por esta Procuradoria Jurídica não substitui o parecer das Comissões Permanentes, porquanto essas são compostas pelos representantes do povo e constituem-se em manifestação efetivamente legítima do Parlamento.
É o parecer.
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